terça-feira, outubro 20, 2009

Notáveis 7ª arte

Let the Right One In de Tomas Alfredson (2008)

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A beleza poética desse sentimento a que invocamos como “amor” é um poderoso ingrediente de narrativas - umas mais verdadeiras que outras, todas elas excelentes histórias, ou fábulas, invariavelmente de penoso desenrolar, dadas às mais variadas e desventuradas agruras, a que fatalmente, e por natureza própria, estão sujeitas. Salvam-se, não raras excepções, todas elas de um final feliz. Feliz e previsível, e que garante o último reconforto para os corações que a acompanham.

Por dentro destas histórias de amor, a variante mais explorada é a dos amores impossíveis. Impossíveis por causa e efeito. Juntam-se dois seres de mundos diferentes, de natureza incompatível – como se costuma dizer –, e fabrica-se sonhos, impulsionados pelo tal sentimento inspirador a que poucos fogem.

Uma história, deste género, entre um humano e uma vampira, promete, à partida uma de duas coisas: uma patusca comédia de ir às lágrimas, ou então, um tremendo blockbuster americano, abonador das mais inefáveis apoplexias juvenis, patrocinadas pelos habituais problemas hormonais da idade, ainda por resolver.  

Let the Right One In é um filme de amor e de vampiros, uma adaptação da história de John Ajvde Lindqvist, pelo próprio, e dirigida por Tomas Alfredson.

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Há mordidelas, sangue, membros decepados, caras desfiguradas e assassínios brutais, tudo o que se espera num filme de vampiros; mas há, principalmente, e antes de tudo isso, uma lenta melancolia que percorre todo o filme, desde a noite sombria e gelada, salpicada pela indolência da neve que caí, até ao cinzentismo do subúrbio e as suas singulares personagens que o povoam. A completar este quadro, há uma encantadora banda sonora, que a par da sonorização envolvente, acompanha o deprimente cenário. É aqui que o filme começa a resultar e o torna realmente diferente, dos seus parceiros de género. Alfredson dá-lhe uma cinematografia e uns efeitos visuais simples e eficazes, directos ao texto de Lindqvist, tornando o seu visionamento absorvente e hipnotizante.

O jovem Oskar é o ponto central desta história, um adolescente solitário de 12 anos dos subúrbios de Estocolmo, fruto de uma família disfuncional, de pais separados e vítima de bullying, na sua escola. Para Oskar o tormento é aguentado com a esperança do ripostar, treinado diariamente em sua casa e no pátio com o seu punhal, disposição que alimenta com a sua colecção de notícias, de homicídios. Um dado dia, Oskar vê chegar os seus novos vizinhos, um homem com uma rapariga da sua idade – Eli que o conhece, mais tarde, no pátio do seu prédio, também ela, aparentemente, uma solitária de estranhos trejeitos, com quem desenvolve uma amizade afectuosa. Nesta altura começa uma série de homicídios brutais na zona, já declaradamente levados a cabo por Hakan, o individuo que acompanha Eli e lhe tenta satisfazer a sua natural necessidade por sangue. 3255921509_ddd70be9dd_b Hakan e Eli são os protagonistas de uma cena, ao mesmo tempo grotesca e tocante. É este o segundo motivo porque o filme resulta tão bem, a interpretação das personagens Oskar e Eli, pelos dois jovens actores suecos, tornam a experiência deste filme uma realidade contagiante, durante as quase duas horas de filme.

Há muito para explorar neste filme, que a coberto de uma história fantasiosa, encerra uma composição alegórica sobre solidão, isolamento, rejeição e a força da nossa própria natureza, à qual estamos presos, e em que a bondade e a maldade, não passam de artifícios pelos quais tentámos garantir simplesmente a nossa existência.

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O título do filme baseia-se no conhecido ditado que um vampiro não pode entrar na casa de alguém sem ser convidado. Assim acontece também nas nossas vidas, em que vamos escolhendo, bem ou mal, as pessoas que nela deixámos entrar, tomando cada uma para si, e ao seu jeito,  um pouco do que é não nosso e muito do que só faz sentido se for partilhado - como por exemplo, essa coisa a que chamamos amor.

1 comentários:

Hélder Aguiar disse...

Um filme de vampiros fora do convencional que, com o seu humanismo, tenta mudar o estereótipo já gasto do género. Estou muito curioso por vê-lo.