Cosmos de Carl Sagan (1980)
“Se um ser humano te desagrada, deixa-o viver. Em 100 mil milhões de galáxias não encontrarás outro igual.”
Sejam bem-vindos a conhecer, ou a redescobrir, uma das maiores e mais intimistas obras de divulgação científica, do astrónomo, pedagogo e incansável divulgador de ciência, Carl Sagan.
Cosmos é a sua obra mais conhecida, livro, que mais tarde, deu lugar a uma famosa série televisiva, com o mesmo nome. Além de divulgador de ciência Carl Sagan foi autor de vários romances de ficção científica e teve um papel importante nas missões de exploração Mariner, e da Viking 1 e Viking 2, da NASA.
Nos capítulos “Blues por um Planeta Vermelho” e “Relatos de Viajantes”, descreve pormenorizadamente estas missões, a sua importância e os dados novos que trouxeram para o conhecimento dos nossos planetas vizinhos mais próximos, mas também o caminho feito até lá anteriormente, pelas missões soviéticas e pela missão Voyager aos planetas mais externos do sistema solar - Júpiter e Saturno, Úrano, Neptuno e Plutão.
Imagem de Io, a maior lua de Júpiter, obtida pela missão Voyager 1.
Nas mais de 450 páginas, que preenchem o livro, encontramos bem mais do que meros relatos de exploração espacial; é-nos apresentada uma lição entusiasmante sobre a procura de respostas à intrínseca curiosidade do homem, ao longo dos séculos, por tudo o que nos rodeia. De Eratóstenes a Copérnico, passando por Kepler, Galileu, Newton e Einstein, percorremos os séculos, as interrogações e os trabalhos que nos levaram até à posição que ocupamos agora.
Para Carl Sagan o nosso destino é o conhecimento, e a verdadeira importância do nosso mundo está na coragem das nossas perguntas e profundidade das nossas respostas. As perguntas, como descreve, começaram desde que o homem olhou para o céu; as principais respostas começaram a ser encontradas no séc. III a.C, naquele que foi o maior centro mundial de comércio, cultura e saber – a cidade de Alexandria. Mas o declínio do saber, no mundo antigo, veio de dentro da própria Alexandria. A sua, inicialmente, maior impulsionadora, a filosofia, censurou-a mais tarde, com o seu desprezo pelo prático - Platão incitava os seus seguidores a não perderem tempo na observação, centrando-se apenas no pensar; Aristóteles defendeu que os de classe mais baixa, e por isso inferiores, deviam estar sempre sob o mando de um dono, o que para Benjamin Farrington, historiador de ciência, justifica o declínio da ciência no mundo antigo. A tradição mercantil e esclavagista fomentou o desprezo do trabalho manual pelas elites – a ciência faz-se de trabalho manual –, a riqueza e o poder eram obtidos pela posse de escravos, a ociosidade diligenciou a insipiência e a religião acabou por imbuir os dogmas, por vários séculos.
Representação de Hipátia, por Charles William Mitchell, filósofa, cientista e educadora de Alexandria, brutalmente assassinada por partidários do arcebispo de Alexandria, Cirilo, que com conchas de abalone separaram-lhe a carne do osso. A maioria dos seus trabalhos foram queimados, os que sobreviveram foram um legado importantíssimo para a filosofia e ciências. Apesar disso o seu nome foi esquecido e Cirilo acabou santificado. Começara a Idade das Trevas.
A incitação da ciência nos últimos três séculos, continuou muito do trabalho interrompido pela destruição da Biblioteca de Alexandria (sabe-se lá em que pé estaríamos hoje se tivéssemos acesso a uma pequena parte do seu conteúdo que foi destruído), e de um grande número de homens, e algumas mulheres, que se acharam a encarar os obscurantismos das suas épocas, pagando, não raras vezes, com a sua vida. A ciência, felizmente, é uma linguagem dinâmica, Seguindo, por outro lado, hoje, os mesmos princípios fundamentais da ciência de Eratóstenes, no que se agora resume como o método científico, baseando-se, sinteticamente, em duas regras fundamentais, que sempre chocaram com o espírito humano: o de não haver verdades absolutas - todas as asserções devem ser cuidadosamente examinadas com espírito crítico - e, que tudo aquilo que entra em contradição com os factos deve ser afastado e revisto.
Espantado com o céu que nos cobre, preenchido com mais de 100 biliões de estrelas, o homem, e depois cientista Carl Sagan, arrasta-nos para uma viagem de descoberta da nossa espécie, da sua evolução, da rocha em que habitámos, dos astros que nos acompanham, até às estrelas mais distantes, todas elas, obedecendo escrupulosamente às mesmas constantes físicas da natureza, constituídas pelos menos elementos químicos, que milhares de milhões de anos de evolução molecular, levaram ao aparecimento de vida no nosso planeta, tal e qual como a conhecemos.
“O céu foi feito pela vida”
Nebulosa Roseta, constituída essencialmente por hidrogénio, átomo fundamental e base da evolução da vida na Terra.
Sagan é particularmente eficaz na persuasão do seu grande objectivo, da mensagem que levou a todos os cantos do planeta - da ideia da nossa “cidadania cósmica”, de uma existência que temos de deixar de encarar narcisicamente, mas sim como parte que é do próprio cosmos que toma consciência de si.
Entusiasta das viagens e da comunicação para lá das estrelas, dos postos de escuta do espaço, levada a cabo, nos nossos dias, por centenas de observatórios por todo o mundo, defendia, baseado em premissas científicas, a existência de vida noutro sítio do Universo, ainda que fosse de um tipo diferente da nossa. Em 100 biliões de estrelas, poderá haver, segundo os seus cálculos, até 1 milhão de civilizações. A milhões de anos de existência, ou mesmo já aqui ao lado, na estrela mais próxima do Sol, a Alfa Centauro, poderá existir realidades tão ou mais complexas, civilizações técnicas como a nossa, que sujeitas às mesmas leis universais da natureza, procurarão, por certo, em determinada altura, os seus vizinhos no espaço.
Mas mesmo que a Terra possa ser o único planeta com vida no Universo, nesse caso, a nossa responsabilidade de não nos destruirmos, a nós próprios e ao planeta em que habitámos, de combatermos as nossas “paixões reptilianas”, é ainda mais premente. Devemos isso, no limite, ao acaso da conjugação perfeita de condições que nos permitiu aspirar ao que somos e ao que já conseguimos alcançar.
“Os mundos são preciosos"
Terra vista da Lua. Foto tirada durante a missão Apolo 11.
O ano Internacional da Astronomia, que se está a festejar, é um bom motivo para encontrar a obra de Carl Sagan, um apaixonado pela astronomia e pela vida.
Cosmos é a sua obra maior. Brilhantemente explícita, de leitura fácil e com uma linguagem acessível e clara a todos, mesmo para aqueles para quem a ciência não lhes diz nada. Sagan tem o talento de nos falar, não só ao intelecto, mas, principalmente ao coração, apelando ao homem e à sua humanidade, à busca pela descoberta da consciência e do espírito humano, dos verdadeiros valores que nos devem nortear, e da nossa responsabilidade e relação com os outros, com o nosso planeta e com universo…, com o cosmos – tudo o que existe, existiu e existirá.
2 comentários:
Bonito post. O universo e algo fascinante...sempre o foi e sempre o sera...por quer que seja o nosso grau de evolucao...O universo sera sempre um misterio...
Tenhu observadus...
PS: Bunito seria ver o Benfica numa Final da Champions League Intergalatica...Talvez contra uma ekipa proveniente de Andromeda...Who knows?
Carl Sagan avé o/
Grande post!
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