O Navegador da Passagem (2008)
de Deana Barroqueiro
“Aos heróis anónimos portugueses, do passado e do presente que a nossa história não consagrou;”
Ler: mais que ver, é uma das etiquetas deste post, neste caso particular, podemos também dizer que é aprender e conhecer, poderíamos acrescentar uns quantos outros adjectivos a esta expressão (por exemplo: entreter), mas estes penso que sejam suficientes e cabalmente definidores da obra em que nos deteremos nas próximas linhas.
Descobri este livro por acaso, chamou-me à atenção não por um acaso, mas por no seu interior tratar de um período da história que por norma nos orgulha e enche de vaidade - os Descobrimentos. Deana Barroqueiro (Prémio Máxima de Literatura 2007 – Prémio Especial do Júri.), tem aqui o seu segundo livro, depois de “D.Sebastião e o Vidente”, do género romance histórico. Desta vez, recorreu a uma personagem da história de Portugal poucas vezes referida e por muitos esquecida, mesmo pelos seus contemporâneos, apesar dos sucessos que logrou conseguir em nome de uma nação: O Capitão do Fim, como lhe chamou Fernando Pessoa, Bartolomeu Dias de seu nome.
Bartolomeu Dias o Capitão do Fim.
Bartolomeu Dias é narrador e personagem principal nesta história romanceada, eximiamente bibliografada pela autora como se de um artigo científico se tratasse. Uma das suas principais virtudes é esta, a precisão histórica, até ao ponto que esta era possível com os parcos registos da vida do navegador, muita dela recriada da imaginação da autora.
A acção viaja entre dois tempos: o recordar da viagem sob desígnio de D. João II, que o levou a desbravar grande parte da costa ocidental africana desconhecida, estabelecendo os primeiros contactos com muitos povos da região e, por fim dobrar a última barreira moral atlântica, em 1488, o Cabo da Boa Esperança, possibilitando, mais tarde, a derrota de Vasco da Gama para a Índia, em 1497, no qual também participou; e a viagem na armada de Pedro Álvares Cabral à Índia em 1500, já com D.Manuel I no trono, que num acaso levou à descoberta da “Ilha de Vera de Cruz”, assim denominado então o que a hoje chamámos Brasil. Foi no retomar da rota mapeada pelo próprio Bartolomeu, que a efemeridade do visionamento de um cometa se lhe torna como presságio do seu padecimento. Ironicamente, padecimento que viria a acontecer às mãos do cabo que havia sido o primeiro a domar.
Rota das três expedições marítimas levadas a cabo por Bartolomeu Dias.
Do romance podemos retirar ainda a descrição de várias personagens ilustres daquele tempo: D.João II “O Príncipe Perfeito”, cruel, visionário de um império português marítimo, tão amado como odiado, obstinado por um ideal; D.Manuel I “O Venturoso” que colheu os frutos do projecto do seu antecessor; Diogo Cão, o primeiro navegador a chegar à foz e a subir o actual rio Congo; o judeu Abraão Zacut, astrónomo, braço direito de D.João II, graças aos seus estudos possibilitou a orientação das caravelas em alto-mar e um sistema eficaz de cálculos e registos nas expedições marítimas; o interesseiro, venenoso e trapaçeiro Cristovão Colombo, entre muitos outros.Do romance, são as descrições da vida a bordo das caravelas portuguesas, das agruras de tão tumultuosas viagens, das intrigas que se movimentavam na corte, as relações entre reinos e a situação do malogrado povo judeu que mais eficazmente são relatados no romance. Não estamos perante mais uma ode à epopeia marítima portuguesa, nota-se um claro sentido de reconhecimento dos heróis esquecidos, homens que oferecendo a sua coragem e vida a uma causa (muitos deles, os chamados “matalotes”, desconhecendo-a), como Bartolomeu Dias contribuíram com o seu engenho e audácia para a abertura do mundo ocidental ao oriente, ousando ser maiores do que as fronteiras seu pequeno país os deixava ser, numa época de ouro da história de um país, que só alguns consagrou.
“Jaz aqui, na pequena praia extrema,
O Capitão do Fim. Dobrado o Assombro,
O mar é o mesmo; já ninguém o tema!
Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro.”
(Fernando Pessoa, “Epitáfio de Bartolomeu Dias”, in Mensagem)
8 comentários:
O John Adams português?
Um pouco, apesar de tudo, Bartolomeu Dias não participou na construção de um país. John Adams era um intelectual, Bartolomeu Dias era um bravo navegador a cumprir ordens de senhora majestade. Curioso é constatar que a ambos encaixam os mesmos adjectivos, os dois acabando por ficar na sombra de outros, não obstante a sua importância para a história.
Interessante como Bartolomeu Dias participou nas viagens mais marcantes do período dos Descobrimentos, a dobragem do cabo da Boa Esperança, o caminho marítimo para a Índia e a descoberta do Brasil... tal como John Adams interveio em todos os momentos marcantes da génese dos Estados Unidos. A História não os beneficiou.
Indeed
Eu diria mais.
lol
Indeed
Lolada
Skykodak o que achas tu do Bartolomeu Dias?
É bonito
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