O tempo é espaço
Qualquer evento que tenha lugar à nossa volta ocorre num determinado lugar e num determinado instante. O lugar pode ser descrito, por exemplo, por coordenadas geográficas, enquanto o instante pode ser descrito pelo dia e pela hora a que ocorreu. Temos sempre duas informações distintas, uma espacial (o local onde ocorreu) e outra temporal (o momento em que ocorreu). Newton postulou a independência destes dois conceitos, defendendo o espaço absoluto e o tempo absoluto.
Mais tarde, em 1734, Martinho de Mendonça Pina e Proença, fidalgo da corte de D.João V, defendeu o espaço como a ordem dos corpos coexistentes, e o tempo, a ordem das coisas sucessivas. Já na passagem do século XIX para o século XX, uma série de matemáticos e físicos interligaram os dois conceitos: em certas circunstâncias, se dois observadores, Toné e Mánu, medirem as coordenadas de um
mesmo evento ou o momento em que ocorreu, poderão obter resultados diferentes, mesmo que façam as respectivas medições com toda a precisão possível. Para se calcular as coordenadas espaciais obtidas por Toné, não basta saber as coordenadas espaciais que Mánu mediu; é preciso também saber o momento em que, segundo Mánu, o evento teve lugar. E, analogamente, para calcular o momento em que o evento teve lugar quando medido por Toné, é preciso saber não só quando é que ele teve lugar do ponto de vista de Mánu, mas também onde, segundo ela, teve lugar. O espaço e o tempo estão então interligados.
Hermann Minkowski, professor de Einstein, foi o primeiro a demonstrar matematicamente a importância de se ter em conta a relação entre o espaço e o tempo, e desenvolveu um abordagem geométrica da Relatividade, sem a qual Einstein, como o próprio reconheceu, não teria conseguido elaborar com sucesso a sua Teoria Geral da Relatividade.
Einstein é tão credível que até óculos vende. Imagem captada em Madrid, na legenda anuncia-se: “Donde los genios compran sus gafas.”
Permitam-me agora relativizar estes conceitos matemáticos, que trouxeram o triunfo do intelecto sobre o Universo e que me dão grandes cefaleias de ignorância, abordando este conceito de uma forma bem mais prosaica, explorando de uma forma bem interessante uma forma de olhar para o tempo, no espaço, com a história.
Estima-se em 100 mil milhões a quantidade de seres humanos que já passaram por este planeta, ocupando cada século quatro gerações.***
Imaginemos agora uma longa e densa fila em que cada geração ocupa um espaço, de pé, encontrando-se separada da seguinte, por um metro de distância. Ao percorrer essa fila, em sentido inverso, como quem passa revista à história, 4 metros atrás de nós estaria Einstein a elaborar a lei da relatividade; a 13 metros Napoleão em Waterloo, 16 metros mais encontraríamos no Renascimento com Lourenço de Médici, Leonardo Da Vinci e Galileu; a 80 metros Jesus de Nazaré, e a 100 metros Sócrates na ágora e muito perto Buda debaixo da figueira, um pouco mais além far-nos-iam sinais com a mão os faraós, e logo atrás viria um grande espaço morto, terra de ninguém, e teríamos de começar a contar não em séculos mas em milhões de anos. Teríamos de percorrer mais 400 metros para chegar ao Neolítico. Depois a fila perder-se-ia no horizonte e a 4 quilómetros descobriríamos o Homo sapiens, a 20 quilómetros veríamos o primeiro primata a manejar pela primeira vez o fogo, a 32 quilómetros estaríamos em Atapuerca, e a 320 quilómetros chegaríamos ao reino comum que compartilhámos com os gorilas e chimpanzés.
Curioso de como nessa imensa fila, de 100 mil milhões de seres, só brilhou a inteligência no ínfimo pedaço final; o resto não passou de um abismo, antes que lentamente, sob essa insondável escuridão, começasse a clarear a consciência. Assombros da vida.
***No El Pais, o articulista Manuel Vicente, apresentou esta ideia com preeminência.
1 comentários:
O tempo é um nada que absorve tudo..
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